sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Tempo de delicadezas - 47



Bonequinha de Porcelana chegou um dia aqui em casa com uma mentirada danada. Inventou uma história de ser portadora de um grupo de amigos meus, com a missão de colocar um motorista à minha disposição.
Minha primeira reação, com a mão já cheia de pedra, foi recusar. Não tinha o menor sentido, esta jogação de dinheiro fora. Além do mais, se eu quisesse, eu mesmo tomaria a iniciativa...
Não tinha me dado conta da real extensão do gesto dela. Desde o início, a intenção era tirar da Gêisa a preocupação de atender minhas necessidades.
Quando eu fui falar com ela que não era necessário, Gêisa já tinha aceito, emocionada e agradecida, com um peso a menos nos ombros.

Lac veio aqui em casa. Diante da extensa lista de proibições da nutricionista, passou no Mercado Central e comprou 54 pacotinhos de sementes de flor. Diz ele que era pra embelezar o Meu Sítio.

Júnior me falou que estava com um dvd player sobrando em casa. Perguntou se eu queria ficar com o segundo, emprestado, pra ver filminho, quando eu estivesse de saco cheio. Distraído, esqueceu no lixo do quarto a sacolinha da Americanas com a nota fiscal. Tinha ido naquele dia comprar no dia este suposto segundo dvd player que ele “tinha sobrando em casa...”

Du, aquele que foi comigo no dia da internação, é o lord de sempre. Falou que vinha almoçar comigo. Por azar dele, naquele dia tinha dado um problema aqui em casa e a gente ia pedir marmita. Du nem se tocou. Apareceu, com uma marmita debaixo do braço.

Gêisa inventa desculpa, todo dia, pra eu ir dormir com ela, depois do almoço.

Biano, dia destes, deixou 3 cortes da última versão do Black Denin, desdobramento do tecido índigo que juro que fui o responsável pelo marketing do lançamento no mercado fora do eixo SP-RJ.

Mercinho colocou o problema na minha mão. Que eu propusesse um jeito de continuar colaborando.

Tomás não deixa nem o Diogo ficar abraçando muito ele. No máximo, Carol em primeiro e Gêisa em segundo. Quando fica deitado na cama comigo, eu posso abraçar. Diogo quase morre...

Mesmo não podendo, meus meninos fingem que têm que ir perto do lugar onde eu vou, só pra me dar cobertura.

O menino de Muriaé me pergunta de que maneira pode aumentar a mais valia dele, com o trabalho de um pobre aposentado.

A lista é interminável. Só de gente que arruma um jeito talentoso de driblar minha fantasia de onipotência que resulta na maior dificuldade de aceitar ajuda e de achar que eu posso resolver tudo sozinho.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A resposta do João - 46




João Lara é meu irmão, desde a época que morei no Rio.
Fruto do desvario do Alberico, naquela época eu com uns 25 e João Lara com algo parecido, éramos responsáveis eu, pela Comunicação Interna da Vale e João, pela Comunicação Externa. Só Alberico...

Quando mandei o e-mail dando notícias da minha chegada em casa pra "assessoria de imprensa" que Diogo montou, e, de carona, contando a história da barba, João Lara manda de volta um e-mail assim:

“Paulinho, meu velho e querido amigo,

Celebrar a vida é coisa boa. Deve ser feito todo dia. E você, o Herval, o Alberico e tantos outros talentos que passaram pela Vale, sabiam disso muito bem.

Não sei se você conhece esse causo mas, quando o João Manoel (lembra do Maneco?) assumiu a Comunicação, era um tal de fazer happy hour todo dia. O que começou como uma modesta e super bem intencionada colaboração da turma para amenizar a crise do petróleo (vamos tomar um rápido para esperar o trânsito do rush desafogar e ajudar o Brasil economizar gasolina) acabou virando um ritual diário.

O negócio fica pior. Como o próprio nome define: happy hour dura, no máximo, uma hora. Mas você conhece a gangue. A gente sentava no Villarino às 6/7 da noite e ia emendando, emendando, emendando, muitas vezes até 4 da manhã. Como éramos divertidíssimos, pessoas interessantes, homens inteligentes e mulheres bonitas foram se agregando. Resultado: conflitos em casa, empregos em risco, filhos chorando de saudade do pai, dinheiro faltando no fim do mês, etc.

Maneco, grande líder e gestor de pessoas, um dia convoca uma reunião com seu time para resolver o assunto: "Assim não dá mais! Nossas famílias estão em crise, o trabalho está ficando prejudicado, a empresa está reparando, os nossos parceiros reclamando... além disso, a crise do petróleo acabou faz décadas, porra. Vamos levar essa coisa a sério! Não podemos continuar tomando todas, todos os dias. De agora em diante, happy hour só se for para celebrar uma coisa muito boa!"

Todos concordaram entusiasticamente. Mas, logo depois, foi caindo um silêncio, uma nostalgia, uma saudade antecipada de bons tempos... Aí, se ouviu a voz do locutor que vos fala perguntando:
- "Vale o Sol se por?"
Todos riram muito e, após alguns minutos de discussão acalorada, felizmente, chegamos à conclusão que sim. Vale celebrar tudo.

Eu acho que uso barba há uns trinta anos. Depois de ler seu e-mail e lembrar da história da primavera (que sempre achei bacana), pensei em raspá-la em sua homenagem. No entanto, lembrei-me também da única vez que me vi imberbe nesse tempo todo e o que o Pisca, integrante brilhante do grupo das happy hours que você conhece, disse quando me viu: "Larinha, se você queria mostrar a bunda para todos era melhor abaixar a calça por que, no caso de arrependimento, bastava colocá-la no lugar." E aí, por mais que te ame, desisti.

Logo, vou aí celebrar você.

Beijo.”

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Celebração da vida - 45



Eu saí do hospital no dia 19 de setembro. Quase três semanas, esperando esta data. Agora, faltavam só 3 dias.
Quem me conhece há mais tempo, sabe do meu compromisso com o primeiro raio da manhã do dia 22 de setembro: ele me encontra sem barba.

Acho que a coisa começou nos tempos de Alberico, na Vale, com Herval Braz, meu mentor, pra quem qualquer coisa era motivo de celebração.

Lembro que Herval chegou um dia na maior excitação na Vale.
- Temos que sair hoje. Hoje é 7/7/77. Uma data assim só acontece de 11 em 11 anos!
Acabou. A gente tinha de celebrar.

Desde esta época, ganhei um gosto grande pela importância de se celebrar e venho cumprindo esta liturgia com a maior pompa.
Deve ter pra lá de 30 anos que o primeiro raio da manhã da primavera me pega sem barba.
Na noite de 21 pra 22, espero todo mundo aqui de casa ir dormir, corro no banheiro e aí a primeira faz tchan, a segunda faz tchum e a terceira, tchan, tchan, tchan...

Me divirto com a surpresa do povo, vendo aquela cara de bundinha de nenen onde antes tinha aquele barbão, hoje quase branco...

O pessoal pára, me olha, fica achando esquisito. Aí eu falo, ligeiro, pra acabar com a dúvida:
- Mudei os óculos.
E tem neguinho que cai e aceita a explicação.

Voltar a barba não tem muito mistério. É quando me cansa começar o dia escanhoando meu queixo gordo.
Normalmente aproveito os feriados de semana santa ou carnaval, pra dar tempo pra ela ficar mais encorpada.

Mas o grande compromisso é na noite de 21 pra 22 de setembro.
De uns tempos pra cá me dei conta que a importância deste compromisso com a primavera tem uma importância maior, pra mim.
É, na verdade, a celebração da vida.

Viva a vida!

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Peso Leve - 44



Um corte ligeiro, no tempo da narrativa.

É que a Veja desta semana saiu com uma entrevista com o escritor inglês Nick Hornby, que, segundo a revista, é um dos principais nomes da ficção inglesa contemporânea. Pra Veja. Porque pra mim, nada pessoal, eu nem nunca tinha ouvido falar do caboclo.
E o pior é que eu fiquei na maior curiosidade pra ler “Um grande garoto”, onde ele retrata um sujeito de meia idade que se recusa a crescer. Estou achando que deve ter alguma coisa onde eu devo me reconhecer ali dentro. O neguinho até está com roteiro dele concorrendo a Oscar.

Mas o que me interessou nem é isto.

O cara tem um filho autista. E Veja perguntou se ele não cogitava de escrever alguma coisa, com toque de autobiografia, sobre esta experiência, de ter um filho autista. A resposta dele fala que a coisa pode acabar virando um peso para o leitor e que ele não consegue pensar em um jeito leve de tratar desta questão.
A citação da revista diz assim:
“Mesmo tendo um filho autista, não creio que teria o desejo de ler um livro sobre o tema. Se o livro se torna um peso para o leitor, não vale a pena. Não consigo pensar em um modo leve de escrever sobre isto.”

Tem hora que eu até acho que não me caiu a ficha direito do que significa ter um câncer.
O fato é que escrever sobre ele e sobre o trabalho que eu e Valente estamos fazendo juntos é que faz esta história perder a carga pesada de uma coisa difícil de ser conduzida.

Ontem, Rachel veio aqui em casa. Corri pra cama e me cobri, pra ficar com cara de doente, assim que ela entrou aqui em casa.
Ela me encheu de bolacha. Falou do medo que estava, desde setembro, de se defrontar comigo mal.
Morremos de rir a tarde toda.

Falar do Valente pra mim é mais ou menos como o Zé Alencar diz. Eu sei que vai ser como Deus quiser.
Mas enquanto isto, eu vou contando pra vocês sobre os bons momentos que Valente e eu estamos vivendo.

Escrever este blog está me fazendo um bem danado...

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

New Business - 43



Vida normal agora pra mim significa três visitas semanais à clínica de hemodiálise. Segunda, quarta e sexta, de 07:00 ao meio dia, você me encontra na minha hidroginástica.

Foi lá que eu conheci seu Zé Ribeiro. Seu Zé Ribeiro é empreendedor. Você vê isto logo de cara, ao primeiro contato com ele. Aliás, ao primeiro contato dele com você. A iniciativa é sempre dele...

Seu Zé foi o primeiro companheiro que eu fiz, nesta minha nova rotina. O primeiro e o melhor que eu já fiz, naquela turma. Toda vez que eu saio, às 11e quase meia, ele está na entrada, se preparando pra sessão de meio dia.

Quando falo que ele é que toma a iniciativa do contato, é porque seu Zé puxa assunto com todo mundo. Brinca, provoca, conversa, sempre de pé e risonho.

Seu senso de oportunidade, qualidade invejável dos grande empreendedores, fez ele escolher a sessão de meio dia. Começa a trabalhar cedo, desde 7 da manhã ele pode ser encontrado no batente. Vai até 11 e pouco, fica na hemodiálise até 16:00 e pega o segundo turno, de 17:00 até o finzinho da tarde.
Diz ele que é o happy-hour.

Seu Zé tem sempre com ele um arsenal de coisas de preço baixo. Até umas 3 pratas. É uma loja de dollar-bill ambulante. A não ser que o tempo mude e comece a chover. Aí seu Zé vende guarda-chuva, capa e acessórios afins.
Seu Zé Tem um comércio, como diz ele, na Pedreira Prado Lopes, que fica administrado pela mulher dele durante o dia.

E complementa a aposentadoria se transformando no mais encantador camelô da região da Savassi, vendendo balinhas para nós na hemodiálise.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Home sweet home - 42




Gêisa cedeu tudo.
Menos o lugar dela, de frente pra televisão.
O que faz um certo sentido. Afinal, ver televisão na cama com minha monumental barriga na frente é exigir muito daquela mulher que fazia tudo por mim.
Mas, no frigir dos ovos, eu cheguei em casa e nada tinha mudado.

Mentira.

Mudou tudo. Mudou o jeito de dormir, mudou o jeito de comer, mudou o jeito de trabalhar, mudou o jeito de ser olhado por todo mundo.
O troço deu um certo medo, rapá...

Parece brincadeira, mas olha só. Levantar da cama, com cateter, é tora. Um, porque dói pra cacete. E outro é que, antes mesmo de doer, neguinho fica assustado, porque vai doer. Acho que era isto o que mais me incomodava. Que nem no dentista, você tem certeza que vai doer.

Mudou inclusive o padrão das minhas visitas. Minha primeira visita foi a médica do INSS. Eu acabei de chegar em casa, ela me liga. Tinha ido pro hospital. Queria fazer a auditoria.
Acho que a gente se cruzou na portaria. Eu saindo, ela chegando...

A auditora era séria feito o capeta. Ligou pra mim perguntando se podia passar em casa. A pergunta fazia sentido. Era sábado, oito da noite. Que funcionário público ia fazer questão de trabalhar àquela hora?
Mas aí a auditoria foi rápida.
Era só abrir o roupão e estava lá o registro da retirada do rim.

Pronto. A partir de agora, minha vida já ia tomando o curso normal. Ou pelo menos, o que mais parecia de normal, naquelas condições.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Cristiane F. - 41



É bom quando a vida nos descortina um permanente aprendizado.

Nada é tão ruim, que não possa piorar.
Aprendi hoje.

Delenda 14 de fevereiro de 2010.

Nunca mais falem deste dia comigo. Que seja cortado da minha agenda.
Ou melhor, cortado do calendário cristão.

Fui aviltado. Fui vilipendiado. Fui desonrado. Fui abusado, humilhado, deprimido, envilecido, de uma forma jamais vista na humanidade.

Desrespeitado até o caroço.

Tudo porque eu havia esquecido o caminho do banheiro desde domingo no final do dia.

Mas hoje foi o amanhecer de um novo dia.

Agora sim, eu vejo a luz de uma nova aurora.

Estou lindo de novo!

Por favor, não me peçam maiores explicações.

Esqueçam deste assunto.





sábado, 13 de fevereiro de 2010

Carnaval - Edição Extraordinária 07




Você não faz idéia do quanto a turma da Marília do Cuca brilhou, neste pré-carnavalesco.
Começa que o soi-disant Gil (a gente sempre chamou ele de Beto) descobriu uma versão de 1954 de um filme do Príncipe Valente. Robert Wagner, aquele bonitão que fazia o Casal 20, era o papel principal. Devia ter uns 18 aninhos. Adolescente até o osso, esse Valente.

O roteiro do filme é, escarrado, a primeira história do álbum. Tal e qual . Quem quiser assistir, venha aqui em casa. Não empresto nem a poder de reza brava.

Com isto o Gil estourou no plano de milhagem dele pra ir no Meu Sítio. Tem direito a camarote vip, late check-out, tarifa de baixa estação. Marcelo entra de graça...
A segunda coisa é Rodrigo, padrinho do Tomás. Mandou pra mim uma fantasia que me deixou uma reprodução tão real que deixaria o Harold Foster na dúvida. Veja se você acertaria este testezinho aí embaixo...


Pra completar, Cuca e Marília vieram trazer o presente ao vivo e a cores, mal tinha raiado o dia. Foi só o Tomás abrir a porta e ganhou uma chuva de serpentina.


Gêisa, claro, não estava em casa...


Comecei o carnaval com a adrenalina bombando...

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Chuva de Xuxa - Edição Extraordinária - 06



Rodrigo, meu sobrinho, me liga pra falar que estava chovendo Xuxa em Belo Horizonte. Mas que só caia Pelé na minha área.

Prefiro entender que foi um pequeno retoque. Uma lanternagenzinha, que tinha escapado da primeira recapagem.

Mas você acredita que, depois deste sufoco todo, na madrugada de domingo pra segunda me pintou uma crise de apendicite? Ô trem que dói, rapá...

No domingo, a gente tinha voltado do Meu Sítio, feliz da vida, passamos com Tomás na casa do Tái pra celebrar o aniversário dele e viemos pra casa.
Até aí, tudo bacana.

Mas na madrugada de domingo pra segunda, lá pelas três da manhã, começou a doer que eu não conseguia me mexer na cama.

Já na hidroginástica, tomei uma caceta de uma injeção de Buscopan e a coisa ficou suportável. De tarde, corremos no Leco.
Já me encaminhou direto pra fazer a ressonância no Felício Rocho.

Entrei na segunda, saí de lá curadinho na quinta, com duas informações precisas.
A primeira, que retirado meu apêndice eu não teria mais problema nenhum.
E a segunda, que meu carnaval tinha ido pro saco.

Ainda vou tentar negociar com Gêisa, pra gente ir na segunda.
Mas a cara dela está de pouquíssimos amigos.
Se rolar, eu te falo.


ps: Mamãe é bonitinha demais. Falou que hoje é dia de Nossa Senhora de Lourdes e Dia do Enfermo. E que eu ter saído do hospital hoje era a melhor comemoração que podia ter...
ps2: Começamos a criar variações. Choveu Joana Prado e caiu Vitor Belfort. Choveu vida no campo e só caiu bosta de vaca no meu colo. Manda a sua pra mim.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Bibi - 40



Serginho é meu irmão. Nas férias, a gente virava filho da Tia Augusta, irmã do papai. Por isto, Bibi, filha da Cinha, virou minha sobrinha. Mas eu sempre fui encantado com a Bibi. E se a coisa ficou difícil de entender pra você, guarda só que a Bibi é minha sobrinha e pronto. E guarda sigilo também desta história, porque ela compromete a Bibi até o osso.

Desde a UTI, ela estava sempre arrumando um jeito de ir me visitar. Estudante de medicina, ela colocava o jaleco branco, se armava da maior cara de pau que você jamais imaginou que alguém pudesse ter, e entrava no hospital, livre, leve e solta, toda séria, só pra ficar conversando uns 5 minutinhos comigo.

Um dia a Cinha, a mãe dela, apareceu fora do horário de visita, junto com Maíra, a outra irmã. Diante da minha cara de espanto, elas me explicaram, às gargalhadas. Elas tinham entrado pela portaria e quando foram interpeladas pelo segurança, Bibi, superando sua capacidade de decidir sob pressão, falou séria:
- Elas estão comigo!
E foi entrando com uma cara de pouquíssimos amigos.

Cadê que o porteiro teve coragem de barrar aquela futura médica, com cara de adolescente, mas toda remplie de soi-même...

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Se é que você me entende... - 39



Claro, faltava só uma coisa pra eu ir pra casa.
Já eram quase duas semanas no hospital e nada de movimentos peristálticos, se é que você me entende. Eles estavam muito mais pra estáticos, estes meus movimentos. Xande estava começando a não achar bom. E se tinha uma coisa que eu gostava mais ainda do meu médico é que ele fazia tudo pro corpo responder naturalmente. Remédio, só em último caso.

Eu acho que comecei a chegar no último caso. E tome colherada gigantesca de óleo mineral. Antes de dormir uma, logo que acordei outra, e nada... Eu ficava sentado na poltrona, de fraldão[1], vendo tv e esperando.

Aproveitei pra fazer uma ginásticazinha e fui até a janela, cumprimentar o sol da manhã e me deleitar com uma belíssima vista da Serra do Curral.

Diogo tinha passado lá antes de ir pro escritório e já estava se preparando pra ir embora. Foi quando ele notou que minhas flatulências tinham marcado o lençol, se é que você me entende. Humilhado, eu olhava pra ele pedindo comiseração e solidariedade e recebia de volta uma sonora e desrespeitosa gargalhada.
- Me leva no banheiro agora, implorei eu.

Não deu tempo.

Eu começava a tirar a roupa e Diogo rindo, olhando pra questão em pauta que corria pela minha perna, se é que você me entende.
- Cara, é muito cocô! dizia ele sem parar...

Foi um tal de chamar enfermeira, faxineira, todo mundo contagiado pelo riso do Diogo e eu lá, um caco humano, arrasado com o desfecho da história.

Agora, finalmente, eu estava pronto pra ir pra casa.




[1] Xande me dava o maior esculacho quando me via de fraldão. Dizia que eu estava a dois passos do banheiro. Eu que levantasse e fosse até lá, me provocava ele. Mas cadê que eu corria o risco...

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Mezzo a Mezzo - 38

Por recomendação do Marcelo Nefrô, eu tinha que instalar um cateter antes de sair. E era conveniente que este cateter fosse um de longa duração. Lá fui eu, obediente, pra sala de cirurgia.

A pergunta que você faz agora, eu fiz na hora:
- Que história[1] é esta, de cateter de longa ou de curta duração?

Para a wikipédia, cateter é um tubo que pode ser inserido em um ducto ou vaso (cateter vascular), em uma cavidade corpórea natural ou em uma cavidade cística ou de abcesso, possibilitando a drenagem ou injeção de fluidos ou o acesso a instrumentos cirúrgicos. Você achando pouca informação, vai no http://pt.wikipedia.org/wiki/Cateter_vascular e procura mais. Resumindo, é uma bobaginha pra tirar ou colocar fluídos no seu corpo.
O meu ficou assim, na altura do meu peito:

Agora, a questão do longa ou curta. É que, como o procedimento é invasivo[2], existe o perigo real de infecção. E considerando que eu, Valente e o cateter íamos conviver por um bom tempo, a de longa duração cuidava mais deste aspecto.

Só que ninguém me falou que doía muito mais, a inserção do cateter de longa. Lá fui eu pro Centro Cirúrgico[3]. E o GianCarlo, chapa do Xande, me falou:
- Você precisa ficar com este braço seu todo relaxado.

Pela primeira vez eu vi Valente se organizando com meus órgãos pra eu conseguir fazer o que o doutor pedia.

Acho até que a gente fez um bom trabalho. No final da cirurgia, GianCarlo disse que foi o primeiro caso que ele viu um paciente mezzo algodão, mezzo granito. A parte que ele precisa, eu mantinha bem relaxada e suave, mas a outra metade de mim, trincava de tão dura. A invasão tinha sido um sucesso.


Eu já estava quase pronto pra ir pra casa.






[1] Rodrigo, padrinho do Tomás, costuma substituir “história” por uma palavra mais chula. Mas achei mais apropriado usar história mesmo!

[2] Adorava, os médicos falando “invasivo”. Dá uma impressão que eles estavam pedindo desculpas por cuidarem de mim. Qualquer coisa pra eles era “invasivo”...

[3] Como de hábito, de olhos fechados. Conversava com o médico, com as enfermeiras, mas tudo de olho fechado...