sábado, 26 de dezembro de 2009

Edição Extraordinária 04 - Não vale como história





Acho que este post podia bem chamar de Efeito Colateral.



É que Dênio esteve me visitando, dia destes, e falava do carinho que ele ficou com o nome Valente. O enteado de Dênio é cadeirante. E ele dizia que agora Valente é o nome que ele reserva pra todas as pessoas fisicamente desafiadas. Cadeirante, muleta, amputado, todo mundo, seja lá o nome que se costuma dar, agora devia chamar Valente.

E Cecília, meu anjo da guarda, relacionou esta notícia do Ipê que aconteceu em Porto Velho com o Valente. Soldado dizia que e email é antigo. Eu achei que mesmo assim, vincular esta história com o Valente me emociona. Diz ela:

"Um Ipê Amarelo foi cortado e seu tronco foi transformado em um poste. Após o poste ser fincado na rua, foram instalados os fios da rede elétrica. Eis que a árvore se rebela e resolve não morrer. Mas a reação foi pacífica, bela e cheia de amor. Rebrotou e encheu-se de flores.Assim é a natureza...resiliente !"



Peço a Deus que o meu Valente siga o mesmo caminho...

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Segura na mão de Deus - 28




Minha família é famosa pelas boas relações que tem. É coisa que foi construída ao longo de anos com pai e mãe ensinando pra filho e filha o cuidado com os amigos como um valor essencial. E que os meninos levam a sério, graças a Deus.

Celsinho[1], por exemplo, não deixa ninguém na mão. Quando Ciça morava no Rio e, de vez em quando, ficava de baixo astral, ele saia de Jacarepaguá, de táxi, só pra fazer um dengo nela.

Mamãe, por exemplo, fala com Deus todo dia. E Ele escuta sempre com o maior cuidado.

Fora que, com Deus, tem gente a dar com pau que garante uma ótima relação nossa. Tadeu, filho da Tia Wanda[2], é devoto do Padre Libério. Foi, aliás, batizado pelo próprio. Tadeu me mandou a Nossa Senhora da Medalha Milagrosa que fica ao lado da minha cama. Reza pra mim todo dia.

Vai daí que, uns dias depois da operação, Xande entrou no apartamento do hospital com uma cara de poucos amigos. Coisa rara, diga-se de passagem.

Apreensivo, Xande dizia que eu era o paciente de mais risco pra carreira dele.
Aí a cara dele se iluminava com o sorriso mais moleque que você já viu e ele completava:
- É que se der tudo bem, foi o Tadeu. Se der errado, a culpa é minha.

Eu, por via das dúvidas, aprendi com o Rubinho[3] esta oração aqui embaixo e tenho ela sempre comigo. Aproveita o espírito de Natal e reza ela com sua família.


ORAÇÃO DO PODER

Deus, Senhor de toda força e poder
dá-me hoje a segurança de teu amor
e a certeza de que estás comigo.

Peço ajuda e proteção nesta hora
tão difícil de minha vida.

Preciso de tua assistência,
do teu amor e de tua misericórdia.

Tiras de mim o medo,
tiras de mim esta dúvida,
esclarecendo meu espírito abatido
com a luz que iluminou o teu Divino Filho
Jesus Cristo aqui na terra.

Que eu possa perceber toda tua grandeza
e tua presença em mim,
soprando teu espírito dentro de mim,
para que eu sinta fortalecido
com tua presença em minha vida
hora por hora, minuto por minuto.

Que eu sinta teu espírito e tua voz dentro,
ao meu redor, em minhas decisões
e no decorrer deste dia,
que eu sinta teu maravilhoso poder
pela oração e, com esse poder,
espero os milagres que podes realizar
em favor dos meus problemas.

Não me deixes, nem me abandones
para que eu não caia no desespero
e nem perca a fé em ti.

Pai, não me deixes cair.

Levanta meu espírito
quando me encontrar abatido.

Entrego-te, neste dia,
a minha vida e de minha família.

Livra-me de minhas moléstias
ainda que seja por milagre.

Obrigado meu Mestre, meu Senhor,
meu Irmão, meu Amigo, meu Pai.

Sei que vais me dar a solução
de que tanto preciso e desejo.

Amém.




[1] Dependendo do palco, Celsinho muda de identidade. De terno, sob o sol inclemente do Rio de Janeiro, é dr. Celso. Na casa da mamãe, é Meio Kilo, filho do TiZé, meu padrinho.


[2] E na casa da Tia Wanda ainda tem o Pastor Horácio que mora nos Estados Unidos e me liga de vez em quando dando uma dica de algum versículo bíblico. O pastor não erra uma. Todos que ele me manda, me fazem chorar emocionado...


[3] Rubinho fez um transplante de rim há muito tempo e divide a experiência dele permitindo o download do livro que ele escreveu sobre a história. O site dele é o http://www.rubemmyrrha.com/

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Edição Extraordinária 03 - Não vale como história












Este cartão é uma brincadeira com duas das figuras que eu mais amo na vida.

Mário, casado com a doce Mônica, fez meu debochado e lindo Papai Noel. É dele também a caricatura que aparece no meu perfil do blog. Aliás, quando os meninos eram pequenos, esta caricatura era o Papai Bravo. Gêisa mostrava o quadro e eles, com medo, iam se borrando de medo pra caminha.

Edmundo Novaes, meu irmão na Tv Alterosa e no Turismo da PUC fez este poema. Fez este e um punhado de outros, igualmente lindos. Tinha feito pra ele mesmo. Mas, generoso como é, nem liga quando eu me aproprio das coisas dele. Só quando se trata da Gladys que o homem vira bicho...

A Rainha Sarabi [1] - 27




Gêisa era uma leoa. Mesmo depois da correria diária, ela tomava conta de mim como se eu fosse filhote dela. Aquilo acabava me deixando tenso mas ela era impermeável. Nem discutia. E aí, qualquer um que já tenha visto NatGeo sabe o que significa peitar leoa.
Melhor não...

Não sei como ela fazia. Mas dormia só com um olho e ficava me tocaiando, com o outro. A noite inteira.

O pior é que é impossível pra qualquer cristão[2] ficar em uma cama de hospital e sentir-se confortável. Você fecha os olhos e, quando começa a dormir, acorda incomodado. Dá uma viradinha procurando uma posição melhor e começa tudo de novo.

Aí seu sangue gela, quando escuta o rugido atento da dona do pedaço. A qualquer movimento meu na cama, ela abria o outro olho, sobressaltada:
- O que foi?

Não adiantava explicar que estava só buscando uma posição melhor. A pergunta vinha a qualquer, QUALQUER, entendeu bem?, qualquer movimento meu. A noite inteira era isto.

Tentei o último caminho. Tomás fazia comigo, quando queria ficar sozinho.
Eu fechava o olho e fingia que estava dormindo e que o movimento era involuntário. As primeiras três vezes foi um sucesso. Mas, afinal, leoa não é rainha à toa. Tomei o maior esculacho, plena 3 da manhã.

- Pára de fazer gracinha e responde!!!

Nunca mais. Eu ficava murchinho, murchinho...


[1] Caso sua cultura não seja lá estas coisas, Sarabi era a parceira do Rei Mufasa. Se ainda assim, você não tiver idéia de quem se trata, sinto muito. Seu caso é irrecuperável...

[2] Isto, claro, é modo de falar. Nem muçulmano, nem ateu fogem desta regra...

sábado, 19 de dezembro de 2009

A falta que ele me faz - 26



Eu entrei no hospital orgulhoso de ter chegado aos 122 kilos, harmonicamente distribuidos nos meus 1,83.

Mesmo que você, com este seu corpitcho esquelético não concorde, era esta a minha modesta opinião.[1] Eu tinha largado pra trás 22 kilos depois que tinha tomado a decisão de fazer o último regime de minha vida, no dia 15 de abril.

Depois de uns dez dias de hospital, o povo da nutrição apareceu com uma balança no meu quarto. Daquelas eletrônicas, mudernas, sem a menor chance de dizer que não merecia credibilidade.

Perdi a voz quando o ponteiro bateu em 137. Claro, estava errada. Pedi pra trazerem a minha, de casa.[2] Deu a mesma coisa. Cento e trinta e sete, cravados.

Foi assim que eu percebi que o câncer queria cobrar caro pelo sucesso do trabalho do Xande. Apesar de eu ter feito hemodiálise três dias na UTI, tinha sido pinto, comparado com o que era necessário eliminar de líquidos do meu organismo.

A partir de agora, meu desafio era regular o que eu viesse a beber e deixar a EmoMáquina lavar meu sangue, no lugar do rim que eu perdi.

Foi aí que Valente começou a tomar forma. Agora eu só podia contar com ele pra facilitar a vida da EmoMáquina. A partir do momento que foi necessário tirar o rim esquerdo, Valente percebeu que, mesmo sem vascularização, ele tinha um gigantesco trabalho pela frente.

Lembrei de uma história com Toledo, o consultor que guiou o projeto de modernização da Cedro. Toledo dizia que se tivesse um pouco mais de dinheiro ia fazer a grande virada. Aliás, se tivesse um pouco mais de tempo, ia deixar o nome da gente na história da indústria têxtil. Ou ainda, se tivesse uma equipe um pouquinho melhor que nós, ia fazer a concorrência tremer...
E arrematava logo, continuando o raciocínio: - O dinheiro que nós temos é este, o tempo que nós temos é este, a equipe que nós temos é esta. E vai ser com isto que nós vamos ganhar este jogo. [3]

Foi então que eu ouvi Valente falando comigo, disposto a não deixar barato esta história: - Vai ser com o que nós temos que nós vamos ganhar deste tumor.

Todo animado, peguei minha espada e me perfilei ao lado dele, disposto a enfrentar esta batalha de não deixar o câncer evoluir.



[1] Outro dia encontrei com Bruna, um avião que trabalha com ZéLuiz. Sabe o que ela falou quando me viu? - Schpetáculo!!!

[2] Gordo sempre acha que o problema é a balança.

[3] Fico todo orgulhoso hoje, quando vejo a Cedro estar entre as melhores do setor no país. Dá a sensação gostosa de ter tido dedo meu, ali.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Edição extraordinária 03 - Não vale como história



Guarde bem este dia.

Mas não preocupa porque, se você não guardar, eu guardo.

É que hoje, 17 de dezembro, eu fiz minha primeira hemodiálise sem o catéter.

Meio inesperado, em função de uma ameaçazinha de rejeição, com minhas personal nurses ainda preocupadas se minha fístula já estava suficientemente madura.

Tudo funcionou às mil maravilhas e parece que eu agora fico livre do catéter.

Pra comemorar, que Ciça, minha filha ecocomprometida até o osso, me perdoe, vou tomar um banho de uma hora.

São exatos 110 dias desde que eu entrei na piscina do sítio pela última vez.

108 dias transcorridos desde o último banho bacana que eu tomei, na manhã do dia 01 de setembro. De lá pra cá, só banho tcheco, pra não deixar o catéter correndo risco.


Agora, bacana, estou doido pra ir pro Meu Sítio, nadar com Tomás.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O dia que eu morri - 25



























Maurilo é brother do Diogo.

Mas brother mesmo, de irmão. Não é só gíria não.
É redator da Tom Comunicação e bem competente em tudo relacionado a web.
Toca o blog Pastelzinho, onde sua filha Sophia reina, serena[1].

Eu, por via das dúvidas, acompanho de perto, já que Sophia tem a mesma idade do Tomás, estuda na mesma escola e é dona dos mesmos cabelos encantadoramente encaracolados.
Quer dizer, uma hora...


(É bom que se diga que, refratário à idéia, Maurilo nem escuta, quando eu faço referências a um possível envolvimento entre os dois. )


Um dia, Maurilo postou no blog dele uma declaração de amor pra mim.
Só consegui ler na quinta tentativa.
Antes disto, eu me debulhava em lágrimas já na segunda linha, emocionado com a delicadeza e a generosidade dele.

Ensaiei mais umas cinco vezes pra falar com ele, agradecendo.
O choro vinha, enquanto eu ainda digitava o número da agência.
Aí eu desligava o telefone.

Finalmente, peguei o celular do Diogo e consegui ligar pra ele.
A voz meio embargada, mas eu ainda no controle da situação.
Maurilo atendeu achando que era o Diogo.
Eu comecei a falar, mas cai num choro convulsivo, de emoção.

Maurilo confundiu minha voz com a do Diogo e, jurando que era ele, entrou em pânico:
- Putz, Paulinho morreu!!!

A confusão só se desfez quando Diogo, rindo, me tomou o celular.
No final, nós todos estouramos de rir.


Maurilo, tadinho, deve ter taquicardia até hoje, quando seu celular reconhece o número do Diogo...




[1] Segundo Adriana, Maurilo é nosso web celebrity. Já ultrapassou a fantástica marca de 100 seguidores no Pastelzinho

domingo, 13 de dezembro de 2009

Fácil, extremamente fácil - 24






















Boni é, de longe, um dos caras que eu mais admiro e que está mais presente na minha vida.
Já foi tudo. Nasceu em Rodeador, distrito de Monjolos, um fim de mundo no Vale do Jequitinhonha, colado em Diamantina.
Quando veio pra Belo Horizonte foi gerente de firma de projeto, foi secretário geral do IPUC[1], foi meu colega de sala[2], foi da turma que começou o Centro de Extensão da PUC, me ensinou a organizar meu primeiro evento na Vale, foi do primeiro conselho da Fundação Dom Cabral. Só na PUC Minas deve ter trabalhado mais de 30 anos.

Quando era pró-reitor de extensão da Puc, foi vice-prefeito de Monjolos. Saía de ônibus de Belo Horizonte na sexta de noite, prefeitava sábado e domingo, e chegava na Puc na segunda de manhã revigorado, como se tivesse tido um final de semana na praia .

Morro de inveja do agradecimento do convite de formatura do Pedro, filho dele e hoje cirurgião da Keck School of Medicine da Univerity of Southern Califórnia, que dizia assim: "a meu pai, Bonifácio, exemplo de retidão e caráter".
Simples assim.
E eu, assino embaixo.

Pois não é que Boni, mau como um pica-pau, quando viu minha trapalhada mandando email pra todo mundo com a cópia aberta, me difamava, sarcástico, junto a meus amigos dizendo:
- Isto é estratégia autopromocional daquele gordinho!!!

Boni Fácil me ama...



[1] Nesta época, Boni livrou meu irmão da maior roubada em que ele já se meteu. Paulão usou o mimeógrafo do Ipuc para imprimir os cupons da LoteFoda. O nome do empreendimento dispensa maiores comentários. Boni teve que fazer das tripas coração para que Paulão não fosse expulso do Ipuc. Acho que mamãe nem sonha que, não fosse ele, seu primogênito não receberia o diploma...



[2] Desde que a gente se formou Boni cuida de mim. Acompanha de perto tudo que acontece comigo.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Filho Homem - 23


Gêisa virou mil!

Era pilates, consultório, casa, sítio... A peteca não caia de jeito nenhum. E todo dia, dez da noite, ela ia dormir comigo.
Aí ela chegava e, em 5 minutos, o quarto do hospital parecia apartamento de spa 5 estrelas.

Tudo arrumado e no lugar, a sujeira que eventualmente tivesse escapado do pessoal do hospital ia embora. As toalhas milimetricamente arrumadas, cadeiras no lugar, tudo perfeito. As meninas eram só cuidado, ajudando Gêisa em tudo.

Aí você entende a diferença de ter filho homem...

Toda atenção que Gêisa e as meninas tinham no cuidado com o doente ia pro espaço num átimo quando Diogo chegava. A primeira providência, sempre, era ir na geladeira ver o que tinha de gostoso. Só então ele cumprimentava os presentes. Com a boca cheia. Sempre.
No caminho até a geladeira, jogava a mochila infectada de rua na cama estéril do doente. A enfermeira quase morria.

Terminada esta entrada triunfal, Diogo se jogava de forma igualmente apoteótica sobre a cama. Ou a minha ou a do acompanhante. E, invariavelmente, ouvia da mãe:
- Diogo, cama de hospital tem que ser preservada, meu filho...
Com o sorriso mais encantador do mundo, jurando ser a última vez, se desculpava.
- Foi mal, mammy!!!

No mesmo tempo record que Gêisa deixava o apartamento um primor, Diogo transformava tudo em um pardeeiro.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

You're fired! - 22





Tudo bem. Eu sou meio chato.
A melhor coisa que alguém pode fazer quando me pega de mal humor, é sair de fininho e deixar o tempo passar. Aí fala comigo depois e esquece esta parte.

Diogo estava cansado de saber disto. Ele é meu filho dileto há 33 anos. Não custava nada, custava?

É que a gente tinha elaborado uma lista de pessoas que eu queria que ficasse sabendo da evolução do meu quadro. De quebra, isto ainda deixaria meu povo liberado de ter que ficar dando boletins toda hora, repetindo a mesma coisa, quando não tivesse novidade.

Claro que, como toda lista de casamento, com tudo feito na última hora, esqueci de gente inesquecível. Cássia ficou de fora, Sofal ficou de fora, o povo do Zé Antônio e mais um tanto de gente que eu não queria ter esquecido. Mas meio que contava com todo mundo mandando notícia pra todo mundo e com isto meus chegados todos ficavam sabendo.

Diogo ficou com a responsabilidade de disparar os emails pra todo mundo sempre que o quadro se alterasse. E fez isto com um cuidado bacana. Tanto cuidado que, assim que eu saí da UTI ele preparou um resumo de todos o boletins de imprensa que ele tinha mandado e os recados que as pessoas mandavam pra mim. Era emocionante ver aquele tanto de notícia, de gente mobilizada desejando sucesso.

Mas você acredita que, tudo indo bem, no último boletim ele dá uma pisada na bola que me deixou tiririca. Na maior afronta, me acusou de estar meio rabugento.

Nó! Aquilo me taiou o sangue...

Não demorou um dia. Na primeira oportunidade que eu consegui me sentar diante do laptop (aliás, do próprio Diogo) disparei um email pra minha rede com o seguinte assunto: Procura-se um assessor de imprensa.
E continuava: Diogo me chamou de rabugento em um destes boletins de imprensa. Só soube hoje. Está de aviso prévio.

Nunca paguei tão caro pela arrogância. Na falta de prática em função da semana de UTI, mandei a lista com cópia aberta... Foi um tal de neguinho, de gracinha, replicando pra todo mundo, caixa de todo mundo lotada, um desastre[1]. Pra piorar, Teresa Goulart, ela sim, assessora de imprensa de primeira, começou o movimento Volta, Diogo. Só faltou criar identidade visual.
Ele, claro, adorando.

Um dia este menino me paga...

[1] Aproveito a oportunidade para, de público, pedir desculpas pra quem teve sua caixa de emails invadida por este meu escorregão

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O alien - 21


Ciça, minha filha mais nova, adora assistir sci-fi de madrugada. Mas daqueles trash-movies, bem anos 50, em que o ser alienígena se apodera da mocinha, entra nas células das pessoas e vai se multiplicando a ponto de transformar tudo numa gigantesca e poderosa meleca. Diz ela que fica mais gostoso de você dormir, dando aquele medinho...

Menos quando você está na UTI.

O barulho é diferente. A iluminação é diferente. A temperatura é diferente. De vez em quando, pra quem tem um grau saudável de paranóia (como é o meu caso), a coisa fica com toda a cara de nave Enterprise no meio de uma Jornada nas Estrelas, versão brasileira AIC, São Paulo.
Aí, de vez em quando eu chamava um técnico de enfermagem e inventava uma desculpa. Só pra me resgatar da eventualidade de uma abdução. Dava aquele medo de aparecer o Capitão Kirk e me levar em uma viagem dele ...

Não adiantou nada. A coisa começou a não ter mais controle. Ia aumentando, tomando todo o espaço que encontrava até ficar difícil de respirar. Eu tinha que tentar reverter isto de alguma forma. O medo de ser pego em flagrante ia me fazendo postergar meus movimentos. E a bola aumentando.

Mas chegou a um ponto que não deu mais. Eu comecei a perder o controle dos movimentos de minha mão e meu dedo indicador foi chegando cada vez mais perto. E plá! Chafurdou na minha narina pra retirar aquela meleca gigantesca que já devia estar quase do tamanho do Ibituruna.

O pior da história é que eu esqueci que estava tomando heparina, um anticoagulante dos bons (ou algum nome parecido). Mas foi um tal de jorrar sangue, e eu tentando disfarçar, e eu querendo limpar com o lençol, e eu querendo esconder o lençol sujo, e ...
A coisa estava ficando feia.
Ainda bem que na UTI qualquer anormalidade fica facilmente denunciada. Aí foi aquela humilhação de tomar repreensão do povo todo. Agora, todo mundo passava pelo meu box e balançava a cabeça rindo, com o ar de reprovação que a gente dirige a adolescente pego no ato.

Fiquei arrasado. Mais pela humilhação que pelo mal estar.

Minha vingança foi que, a partir deste incidente, toda vez que o alien se manifestava, eu chamava o Edílson pra limpar meu nariz com cotonete.

Bleargh!!!

Eterna Aliança




Este post é um parêntesis.


Sai um pouco da sequência. Mas o motivo é nobre e quem achar ruim que reclame com Êle.

Aliás, acho que ele é uma consequência direta da Edição Extraordinária. Ou, o que faça mais sentido, a Edição Extraordinária é consequência dEle.

O bacana da foto é Júlio, meu amigo desde pequenininho, cozinheiro de mão cheia. Quer dizer, passou a ser, com este gesto generoso.

Nunca tinha encontrado com o Júlio. Mas o carinho dele me fez voltar a mania de chorar feito menino a cada vez que eu me emociono.

Júlio e Débora são doidos o suficiente pra fazer pilates às 6 da manhã. Gêisa chega um pouquinho depois. E eles, indo fazer uma viagem a Israel e sabendo da minha disposição de não deixar o restinho do câncer voltar, se ofereceram pra deixar um pedido meu no Muro das Lamentações, em Jerusalém.

Quer dizer, na hora que ele me mandou a foto, desidratei...

Mas clique aqui embaixo e fala se não é emocionante. Fala?



domingo, 6 de dezembro de 2009

Edição Extraordinária 01 - Nem conta como história

Esta não está nem numerada. Sai da sequência da história.
É que na sexta eu saí do consultório do Leco walking in the clouds.
Saí da consulta nas nuvens. Não tem nenhum traço de tumor.
Tanto o ultrassom quanto a radiografia, está tudo limpinho, virginal.
De saída, passamos na secretaria de saúde, pra pegar um remédio que substitui a quimio. Doutora Lílian, minha advogada, quebrou o cacete com a Secretaria de saúde. A gente tinha entrado na justiça e consegui ele.
Chama Sutent, da Pfizer.
O potinho, com 28, custa 21.000,00.
Vou repetir, porque você achou que eu errei.
Potinho com 28 por apenas 21.000,00.


Tá tudo dando certo, como Deus quer.
Beijos,

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Tá na hora!!! - 20


Ano que vem é o 40º aniversário da morte do papai. Neste tempo todo, mamãe dedicou sua vida inteira a duas coisas: falar pra gente da saudade dele e conduzir com firmeza e doçura a vida de seus 7 filhos. Cinco meninos e duas meninas, diz ela. E mais Tomás até agora, digo eu.
Ela já passou por algumas ameaças de coração, um câncer de mama e continua com a cabeça ótima, apesar dos joelhos já darem mostra de cansaço nestes seus oitenta e uns anos.

Diz a lenda que eu sou o preferido dela. Ela jura que não faz diferença entre nós. Mas eu gosto bem da cara feliz que ela faz quando eu chego lá em casa. Acho que por isto, coisa mais esquisita que eu já vivi, fiquei com medo de falar com ela, quando estava pra sair da UTI. Mas muito medo mesmo. E isto depois de uma semana de imersão lá naquela cápsula, isolado do mundo.

Outra descompensada das boas que eu dei foi com Nando. Nando é o penúltimo dos sete irmãos. Mora em Resende, aposentado, e conseguiu uma folga das aulas de economia na faculdade pra vir dar apoio pra nós todos durante a operação, com a Ione, mulher dele. Deve ter sido resto de piração de anestesia mas você não acredita o medo que eu fiquei de não ver o Nando nunca mais. Não era claro pra mim se era medo de eu morrer. Ou ele...
O medo era de nunca mais eu ver aquele gigante de quase dois metros de puro bom humor e generosidade.
Engraçado que não tive isto com ninguém. Nem com Tomás.

Terminado o prazo da licença de uma semana, Nando teve que ir embora. E não tinha ido nem uma vez à UTI, pra deixar a oportunidade pra Gêisa e os meninos, já que as visitas eram limitadas. No domingo de manhã, antes de ir embora, ele achou que estava passando da hora de acabar com esta minha bobagem. Irrompeu UTI adentro, surdo às minhas tentativas de querer passar o resto da vida protegido por aquela casca.
Entendi porque que Jill Bolte Taylor, a tal neuroanatomista do livro que a Ju me deu, diz que medo aparece a partir de expectativas falsas que parecem reais.

Mas foi batata. Nando chegou, eu chorava e ele ria. Ficou lá até eu me acalmar. Dizem as meninas que ele é meu maior concorrente no posto de preferido. E que depois desta história, elas diziam que ele tinha virado MEU preferido também. Por via das dúvidas, como lá em casa a gente é muito ciumento, não posso contar esta história pra ninguém, ou meus irmãos caem de pau em cima de mim.

Mas agora você entende porque o começo desta história falava sobre mamãe. Muito espertinha, ela passou a usar a mesma estratégia. Ligava, tadinha, e eu fingia que estava dormindo, aproveitando que ninguém tinha coragem de me acordar.
Gêisa contou pra ela.
E ela, com a maior doçura do mundo, foi ligando, esperando a hora que eu tivesse coragem de atender.
Aí, acabou. Falei com Dona Ester e o medo adormeceu, embalado pela voz dela.
Igualzinho quando eu era menino.

Já estava mesmo na hora de eu encarar o mundo.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Emo - 19




Todo dia de manhã, chegava aquele trambolho na UTI. Era uma caceta de um robô, pesadão, desengonçado, que fazia um barulhão danado quando as rodinhas rangiam contra o piso da UTI, diriigida por um baixinho transbordando de simpatia, .

Já de cara, eu fiquei resistente com a máquina, tadinha. Eu nem bem tinha começado e meu ato falho mais recorrente era me referir a ela como hidroginástica. Não era piadinha, não. Era ato falho mesmo.
O tal baixinho era Hélio, o técnico que ia me aplicar nesta história de hemodiálise, que promete ser minha companheira por um longo tempo.

Hélio era uma figura interessante. Fazia teologia e se preparava para ser pator. Com isto, a formação dava a ele uma cultura bem fundamentada e ele gostava de saber que a gente podia enveredar por bons papos. Eu também, pra falar a verdade.
Ele tinha uma curiosa noção de limite. Não ria mais que o razoável, não provocava assunto mais que o esperado, nunca forçava ... Tudo meio que respeitando eu me familiarizar com a nova rotina. Afinal, cada sessão de hidroginástica, aliás, de hemodiálise, tomaria 4 horas onde, fisicamente, não via nada acontecer. Hélio chegava, me plugava na máquina e pronto. Ficava eu me defrontando com a maldição do relógio da UTI.
Era que nem quando você enche o tanque do seu carro. Estaciona ao lado da bomba, espera um tempo, e voilá. Estava feito
Era isto.

Mas rapidinho eu me resolvi com a máquina. Não havia nada o que fazer. Aquilo era vital e não me causava absolutamente nenhum incômodo. Nenhuma dor, nada... Mas, por outro lado, eu não conseguia fazer mais nada. Não conseguia ler, não conseguia prestar atenção em outra coisa. Ficava olhando, maravilhado, tentando entender como aquela geringonça lavava meu sangue e me deixava momentaneamente estabilizado. Até a próxima sessão.

Rapidinho, comecei a gostar da máquina ...