sexta-feira, 30 de outubro de 2009

The day before - 04


Eu estava envolvido com um projeto revolucionário. Tratava-se de preparar um grupo de perto de 1.300 empreendedores do Brasil todo pra tocar seu próprio negócio. Eu fiquei com uma parte do conteúdo de Marketing, e ia ajudar este povo a fazer bonito em Recife, Rio, São Paulo, Ribeirão Preto, Belo Horizonte e Santa Rita do Sapucaí.
Todo mundo doido. Todo mundo gênio. Era inovação pra dar com pau...
Aí, na véspera de eu viajar pra Santa Rita, eu estava conversando com Pingo na entrada do meu prédio. E me deu uma dorzinha do lado direito, entre o rim e a virilha. Só isso. Pronto, acabou. Nada mais complicado.
Quando entrei em casa, fui no banheiro fazer xixi.
Apesar da vontade, nada do xixi sair...
Lá pela terceira tentativa, eu começo a perceber, como se estivesse enxergando, uma pelota percorrer toda a extensão do meu pinto e cair no vaso, fazendo ploft. O vaso ficou todo vermelho de sangue. Pronto, mais nada. Acabou...
Só não acabou meu pânico, com medo do que podia ocorrer na viagem pra Santa Rita.
Corri no telefone pra falar com Xande, primo da Gêisa e meu urologista. Imediatamente, ele já entrou em contato com Tetê, prima nossa também e bambambam de diagnóstico de imagem. Tetê furou as filas todas e garantiu que eu fizesse os três exames que Xande queria na quinta, 06 de agosto, de manhã. A médica era Luiza, irmã da Lu, minha ex-namorada dos tempos de Colégio Estadual.
Tetê e Luiza abriram o tapete vermelho e me receberam com abadá pro camarote vip. Parecia que estava todo mundo me esperando. Mordomia total...
O resultado, pro que eu precisava, veio na hora.
- Não é nada que te impeça de viajar.
E aí, lá fui eu com 6 garrafas dágua de carro pra Santa Rita, numa viagem agradabilíssima, principalmente pela companhia de Michel Abras, que ia comigo no mesmo projeto. Saímos de BH às 3 da tarde e chegamos por volta de 9 da noite, com as 6 garrafas vazias no chão do carrão chic, banco de couro, freio ABS, airbag pra todo lado.
Eu já estava no quarto do hotel, dente escovado e xixi que era bom, nada...
Tomei mais duas garrafas. Nada...
Quersaber, em vez de ficar com o grilo, tirei o pijama, levantei e fui no Pronto Atendimento da cidade. Cheguei 22:07 e fui atendido 22:08. Parecia que o médico tinha ficado grato por alguém ter ido vê-lo.
Ele ouviu minha história com uma atenção incomum para os PA’s de Belo Horizonte, me examinou com a maior calma do mundo e soltou o veredicto seguro:
- Você está ótimo!
Voltei pro hotel tranqüilo e bebi mais duas garrafas dágua.
A partir daí, acordei a noite inteira, devolvendo os quase 5 litros dágua que eu havia bebido durante o dia. Dormir que era bom, nada.
Dois dias de aula tranqüilos. E no sábado, mais seis horas de viagem. Cheguei um pouquinho depois da meia noite, no dia 09 de agosto, pra dormir abraçadinho com Gêisa.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Comer, comer - 03






Minha vida toda foi uma permanente luta contra a balança. Eu estava sempre acima do meu peso. O que estava em discussão era só quanto.
Às vezes muito, às vezes só um pouquinho.
Mas sempre acima.
No dia 14 de abril de 2009, assim, do nada, Aguinaldo meu irmão me liga e fala de um regime que estava fazendo e que havia feito com que ele perdesse 20 kilos em quatro meses. Aí, ficou de me mandar um email com a dieta. O email era assim:
“A dieta com saúde
Amanhã começa seu novo dia: acordado, de cara tome dois copos de água. Vá para a mesa de café somente depois do banho. Antes de vestir-se tome mais um copo de água.
Vestido, vá para a mesa. Uma laranja média e 1/4 de mamão havai. Coma duas fatias de pão integral com café à vontade, sem açúcar. Não vale queijo que não seja o cottage. A quantidade de queijo cottage deverá ser módica.
Marque o seu horário de café para que você não fique mais do que três horas, de jeito nenhum, sem comer alguma coisa tipo laranja, pera, maçã, morango, ameixa - pequenas quantidades.
Durante a manhã tome água até sair pelos poros. Na hora que a sua urina estiver absolutamente clara você tomou a água suficiente. Isto será mais ou menos 6 copos de água.
Almoço - só beba água até 1 hora antes. Faça um prato que vc fique apavorado de fazer fotossíntese de tão verde. Coma a vontade sua salada.
Nela não vale nenhum carbohidrato. Cuidado com queijos e qualquer derivado de leite na salada. Isto não ppppppoooooooddddddeeeeeee.
Depois de comer a sua salada maravilhosa, regada a pouco azeite e quase nenhum sal, pegue uma colher de arroz (duas colheres de sopa) não muito cheias. Não vale a colher de estivador. Coma um refogado qualquer, brocólis, couve, almeirão, acelga, chuchu, repolho. Não vale moranga e vagem.
Lembre-se também que você somente poderá comer o que produzir debaixo da terra que seja cenoura vermelha. Nada mais.
A carne ficará a seu gosto. Sem gordura e quantidade máxima de 150 gr.
Um café sem açúcar. E saia logo da mesa.
A partir de 1 hora deste almoço, comece a ingerir água. Muita. Não fique mais do que três horas sem se alimentar frutas de baixa caloria, em pequenas quantidades. Melancia, por exemplo, não é muito legal em dieta.
A noite repita no jantar o seu almoço ou café da manhã. Pare de tomar água para não ter de ir ao banheiro de madrugada.
Antes de dormir um Activia Zero.
Você vai dormir sem fome nenhuma.
Esta dieta tem aproximadamente 1200 Kgc. Em 30 dias vc terá condições de começar a caminhar o que deverá ser feito pelo menos três vezes por semana.
Cuide-se muito.”

- Quersaber, disse eu numa entusiasmada conversa com as dobrinhas do meu perfil de boneco Michelin, vou nessa!
A provocação de Aguinaldo me fez vir à cabeça todos os ensinamentos que João Gabriel havia me passado, há uns 12 anos atrás.
João foi um dos médicos mais importantes que passaram pela minha vida. Uma vez falei com ele que eu havia fugido, porque senão eu ia emagrecer.
É engraçado, pensar assim, mas cabeça de gordo é desse jeito.
Fiz as adaptações que João teria feito e resolvi fazer a dieta sério. Era pra ser a última que eu faria na minha vida.
E já no dia 15 de abril, mesmo sem ser segunda feira, comecei o projeto que mudou minha vida.
Descobri que eu tinha comportamento de adicto com doce e pão francês com manteiga. Fui aprendendo a conviver com minhas dificuldades.

E no dia 01 de setembro, depois de ter acabado com a safra de frutas e verduras do Ceasa, entrei pra operação 24 kilos mais magro. Eu havia baixado dos meus habituais 144 para 120 quilos.

Duas questões foram vitais nesta história: uma, que Xande, meu urologista, dizia que eu não podia imaginar o quanto meu risco cirúrgico havia sido reduzido, me operando com 24 kilos a menos. E a outra, a mais importante: quando eu retomei o controle da minha vontade, me foi muito fácil conviver com as restrições que a “dieta renal” me imporia.






Vale lembrar aqui a injusta acusação feita por uma gordinha, companheira da mesma luta contra a balança, entre risonha e com um falso desdém, sobre meus 20 e poucos kilos perdidos:
- Com tumor também, até eu...

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Prazer em conhecer - 02




Eu nunca havia ouvido falar desta história. Nem sabia da existência ou mesmo jamais tinha cruzado com ele. Nem socialmente. Tratava-se de um perfeito estranho pra mim.
Aí, Gilka, um dos anjos da guarda da minha vida, me mandou para uma ultra-sonografia do abdômen total. Um procedimento de rotina pra ela, que cuidava da minha saúde há um bom tempo. Apenas controle.
O médico era Dr. Rogério, bambambam do pedaço, geniozinho aqui de Belo Horizonte. Gilka fazia questão que fosse com ele. Fui lá no dia 14/09/2007.
Analisando o resultado, Gilka sorriu e disse:
- Você recebeu mais do que comprou.
Segundo ela, não seria normal, neste exame, o médico incluir os rins. Mas por sorte minha (eu acho mais que por generosidade do dr. Rogério), apareceu lá:
“...
RIM DIREITO: Com volume reduzido tendo córtico-medular final e usual. No rastreamento com eco-Doppler não se evidenciam vasos neste rim.
Dimensões (LxTxAP): = 91 x 39 x 38 mm, com volume estimado em 71 cm3.

RIM ESQUERDO: eutópico, com volume, forma e contornos normais. Cortiço medular com espessura e aspecto inalterados. Não se observa hidronefrose e imagens compatíveis com cálculos.
Dimensões (LxTxAP): = 153 x 65 x 61 mm, com volume estimado em 315 cm3.
...”
E no finalzinho o relatório informa:
RIM DIREITO ATRÓFICO
RIM ESQUERDO VICARIANTE.

Resumindo: não entendi chongas. E acho que tampouco você, a não ser que trabalhe na área de saúde. A única coisa que significava alguma coisa pra mim era que 71 é quase 4,5 vezes menor que 315.
Um era 4 vezes e meia o tamanho do outro...
Depois minha curiosidade foi aumentando e eu comecei a entender, inclusive, que a coisa nem é tão rara assim. Já apareceram uns 4 a 5 amigos meus convivendo com alguma coisa parecida, com eles mesmos ou com filhos.

Falando nisto, caso te interesse mesmo saber, a definição que consta do Michaelis é a seguinte:
vicariantevi.ca.ri.an.teadj m+f (fr vicariant) Med Diz-se de um órgão cuja atividade supre mais ou menos a falta de atividade em outro órgão.

A morte da bezerra - 01



Esta história começou mais ou menos um mês antes de eu me operar pra tirar um tumor que estava querendo sabotar meu rim.
A Cristiane, minha sobrinha de 13 anos, tinha que ler o livro “O Minotauro” nas férias de julho. A gente já estava no meio das férias, lá pelo dia 20, e ela não tinha conseguido passar do primeiro parágrafo.
Isto mesmo. Não me confundi e usei, inadvertidamente, no lugar de capítulo. É PARÁGRAFO mesmo.
Com o entusiasmo esfuziante de sempre, Lisa, minha filha, resolveu ajudar Cristiane.
- Vamos ler juntos este parágrafo, disparou ela.
E não tinha quem fizesse a Cris entender que a história era sobre um sonho de Pedrinho. Pra quem não souber o que é impasse, vendo a situação, aprenderia na hora.
- Mas eu nunca sonhei assim, Lisa! reclamava Cristiane.
E a coisa não andava.
Criativa, Lisa conseguiu avançar na negociação. Cris ia escrever alguma coisa, sobre qualquer assunto que acontecesse na vida dela.
Neste momento, o telefone toca.
Era o caseiro do Meu Sítio, informando que nossa vaquinha jersey, Dona Moça, havia morrido de complicações de parto.
Meio que no meio da consternação geral, Lisa saca rápido a solução:
- Cristiane, você vai escrever sobre a morte da bezerra!
Cris, coitada, não entendia nada...
- Como assim, Lisa, escrever sobre a morte da bezerra... Vai ter uma linha.
“A bezerra morreu. Ponto final.”
E a gente ria até não poder mais. O almoço virou uma festa.

Estas histórias que reúno aqui são dedicadas à Cris.
São todas sobre a morte da bezerra.
Escrevi um conjunto de impressões sobre o período que passei no hospital, aprendendo a colocar um tumor que apareceu no meu rim no seu devido lugar.

Se a Cris conseguir ler mais um pouquinho, vai entender o que o Valente tem com isto.