Um tempo depois que papai morreu, em 1970, mamãe teve um câncer de mama que deixou nós todos em choque. Hoje, a coisa virou motivo de brincadeira nossa com ela. Mas Dona Ester foi pro hospital, chorando, falando com a gente onde tinha cheque assinado, quanto tinha em qual banco, certa que era a última vez que ela nos veria.
Há uns cinco anos atrás, plantei uma recém-nascida muda de jaboticaba e falei que a árvore era dela. Meio sem gracinha, ela me perguntou: Será que eu ainda vou chupar desta jaboticaba?[1]
Outro dia, mamãe reclamava com Lisa, minha do meio, que ela não sabia que envelhecer seria tão difícil. Lisa chutou o balde e falou com ela, na lata:
- Mas vó, tem mais de 20 anos que a senhora é velha e só tá reparando isto agora? Então tá muito fácil, esta história de envelhecer...
Ontem, mamãe, longeva que só ela, completou 90 anos. Encheu a Igreja de Santo Inácio, com amigos dela e nossos, agradecendo a Deus pelo privilégio de estar acompanhando nossas vidas.
Adriana do Cuca leu[2], ao final da missa, este texto que ela e Rachel da Flavinha, com o auxílio luxuoso da Ciça,
prepararam.
Hoje estamos aqui para falar de uma das
pessoas que mais admiramos na vida.
Dela, temos as lembranças carinhosas, as
férias na casa da avó... almoços e agora lanches de domingo... os mimos... as
histórias...
Alguns a conhecem por Ester, muitos Tia
Teca e outros até por Teté. Para
nós, será sempre a Vovó Teca.
Ela é aquela que nunca se cansa das
nossas brincadeiras, que sempre arruma forças para segurar o Antônio, que
sempre fica andando atrás do Henrique mostrando uma brincadeira diferente, que
sempre lembra ao Tomás a sacola cheia de brinquedos que ela guarda no quarto e
que sempre segura o Tadeu coberto com um lençolzinho e todo cuidado do mundo.
Conforme a gente foi crescendo, ela foi
se transformando em referencia para tudo. Não estamos menosprezando nossos pais,
mas essa avó é demais. Virou modelo de vida, confidente, professora particular
para os que ficavam em recuperação no final do ano. Não dava sossego pra
ninguém.
Quando a gente cresce, consegue perceber
que até as coisas mais simples são capazes de nos marcar para a vida inteira:
Primeiro, o sorriso com que nos recebe
sempre que chegamos em sua casa. Sorriso sempre aberto a qualquer pessoa que
passe por lá. O sorriso sempre vem seguido da exclamação: OH! É você!? ;como se
tivesse anos que a gente não aparecia. Não me lembro de nenhum momento em que
fôssemos recebidos sem aquele semblante de satisfação. Sua casa nos acolhe e ,
por menor que seja, se torna um palácio com um espacinho para cada pessoa que
quiser chegar. Antes ,a sala grande do Gutierrez abrigou as aulas de dança, gincanas, desfiles
de moda e até mesmo um pequeno acidente envolvendo um tampo de mármore, mas, não
se preocupem, ninguém saiu gravemente
ferido. Agora a do São Bento, que mesmo com uma área externa enorme para nos
divertir, apesar de pequena, nos acolhe e nos faz ficar mais tempo dentro de
casa. Quem precisa de um bronzeado no verão quando se tem a Vovó Teca pra prosear.
Segundo, a força. As vezes me pego
pensando como uma mulher pequenininha teve 7 e grandes filhos, se viu viúva de
forma repentina e antecipada. Com a responsabilidade de continuar a sua vida e
a de uma família inteira, ela sempre deixou que os filhos acreditassem que eles
estavam tomando conta dela, mas a gente sabe que, no final das contas, até hoje
é ela quem toma conta de todo mundo. Não deve ter sido fácil, foi professora,
teve mercadinho, salão de beleza... sei que a força se transformou em doçura. E
convenhamos, vendo no que esta família se transformou, ela fez um tremendo
trabalho.
Terceiro, o cabelinho branco. Sempre
arrumado, no seu lugar.
Quarto, a casa cheia que nunca
esvaziava. Eram os irmãos, os sobrinhos, os primos, os filhos, os netos para
mais de metro (literalmente), até aqueles que não eram netos legítimos, mas que
insistiam em chama-la de avó (sim, a gente assume, ficávamos enciumados com
isso, mas de que vale isso ?).
Relembrando,
percebemos que esses pequenos detalhes se juntam como peças num quebra-cabeça e
a figura que se forma é essa diante de nós. Essa mulher linda, doce, gentil,
engraçada que quando precisa se transforma numa tigresa, numa muralha ou num
jardim florido cheio de azaleias e ipês, tudo isso num piscar de olhos.
Ela é irmã, tia, prima, mãe, avó e
bisavó. Ela é completa. Ela é o que sempre quisemos ser e o que continuamos
querendo ser quando crescer.
Parabéns Dona Ester.
Parabéns Teté.
Parabéns Tia Teca.
Parabéns bisa Teca.
Parabéns Vovó Teca
Parabéns meu amor!
[1] Ano passado ela chupou a primeira jaboticaba.
[2] Regina também leu. Depois mostro pra vocês.